terça-feira, 25 de novembro de 2014

Caio Pimenta

No meio do tiroteio eleitoral entre Aécio Neves e Dilma Rousseff durante a campanha pela Presidência da República, o tema da regulamentação da mídia sempre encontrava espaço nas discussões. Apoiadores do ex-governador de Minas Gerais acusavam o PT de tentar com a medida uma censura à liberdade de imprensa e expressão, enquanto os partidários da candidata à reeleição levantavam a bandeira de uma imprensa contrária ao atual governo com viés golpista ao dar mais voz à oposição.

 A reportagem da Revista Veja na semana do pleito denunciando Dilma e Lula como participantes do esquema de corrupção na Petrobrás tendo apenas como prova uma suposta declaração do doleiro Alberto Youssef em depoimento à Polícia Federal fizeram os ânimos se exaltarem ainda mais. Protestos em frente à Editora Abril com direito a atos de vandalismo e manifestações em prol de Aécio com a capa da publicação nas ruas do país mostraram a divisão antagônica de uma parte da população.

Com discursos de ódio de ambas as partes e uma intransigência para se escutar pontos de vistas contrários demonstrados, principalmente, no segundo turno da campanha eleitoral, o avanço do debate sobre a regulamentação da mídia se mostra em um cenário conflituoso. Esse panorama impede o clareamento do que seja necessariamente uma regulamentação do setor, permitindo a manutenção de irregularidades e situações prejudiciais para a pluralidade de vozes.

O caso mais gritante disso está relacionado às concessões de emissoras de televisão e rádio a políticos. Mesmo com a determinação do artigo 54 da Constituição Federal proibindo que deputados e senadores firmem ou mantenham contratos com empresas concessionárias de serviço público, a falta de regulamentação do setor abre brechas para parlamentares serem acionistas de meios de comunicação.


Partido fundamental para a sustentação do governo Dilma no Congresso Federal, o PMDB tem o maior número de parlamentares com concessões de TV e rádio no Brasil: 12 políticos. Dona da TV Mirante, afiliada da Rede Globo, a família Sarney está entre os nomes da lista. A oposição também faz parte da festa: o DEM possui 11 parlamentares acionistas ou sócios de meios de comunicação, sendo o nome mais célebre de ACM Neto, herdeiro do legado construído pelo avô Antônio Carlos Magalhães na Bahia. Até mesmo o ex-presidente com impeachment no currículo e atual senador, Fernando Collor de Mello, aparece como proprietário da TV Gazeta de Alagoas.

História

A concessão pública de emissoras de televisão e rádio Brasil afora sofreu uma elevação excessiva durante a ditadura militar. No livro “Vozes da Democracia – Histórias da Comunicação”, a coletânea de reportagens mostra que somente nos últimos dois meses do governo João Figueiredo (1979-1985) houve 91 decretos de concessão, privilegiando grandes empresas como Bandeirantes e SBT. Com a chegada do governo Sarney, houve a criação, segundo a pesquisadora Anita Samis no texto “A Legislação Sobre as Concessões na Radiodifusão”, de uma comissão para investigar possíveis irregularidades nesses atos. O grupo, porém, foi liderado justo por Antônio Carlos Magalhães e, sem surpresas, não se descobriu nada ilegal.

Como as renovações das concessões de radiodifusão no Brasil são analisadas por comissões do Congresso Nacional com a presença de integrantes, muitas vezes, ligados a esses meios de comunicação, o que se vê é a facilidade das emissoras continuarem a funcionar mesmo sem cumprir o que determina a lei.  Fora isso, o lobby feito por grandes veículos de comunicação perante parlamentares influencia nas decisões, pois, os políticos temem se desgastar junto a empresários capazes de modificar a opinião pública. Isso permite a proliferação da propriedade cruzada em que uma empresa possui veículos fortes nos mais diversos setores da comunicação (TV, rádio, jornais e revistas impressos, Internet), ameaçando a livre concorrência.

Para piorar, a regulamentação da mídia e o impacto dela na sociedade ainda não são temas compreendidos por grande parte da população, abrindo espaço para a desinformação. Toda vez que o assunto se torna a pauta do dia surge o temor de uma censura à imprensa e a regulação do conteúdo publicado nos meios de comunicação.


O radicalismo do discurso quanto à regulação da mídia também caracteriza os defensores da proposta. O debate sobre o assunto retorna sempre com mais força quando o governo do PT se vê acuado como no julgamento do Mensalão ou na intensa disputa eleitoral deste ano com a revolta de muitos apoiadores de Dilma com as capas da revista Veja e a cobertura da Rede Globo. Em vez de ser mais ampla e abrangente, a discussão acaba resumida sendo contaminada por questões eleitoreiras ou políticas momentâneas como faz o jornalista e sociólogo Venício Lima no texto “Marco regulatório: a gota d’água” publicada no site do Observatório da Imprensa.

Mesmo sendo necessária e urgente, a regulação da mídia deve continuar emperrada seja pelos interesses de políticos e empresários milionários e/ou pelo acirramento ideológico vivido no Brasil neste ano. Enquanto isso não for ultrapassado, a possibilidade de um setor mais plural com vozes das mais diversas classes capazes de expor ideias e pensamentos diferentes parece cada vez mais distante.




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