segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Por Mayra Sartorato

A mídia tradicional versus a inovação. Revistas, jornais, TV e rádio, de um lado. Sites e blogs do outro. Todos tentam coexistir, alguns mantendo suas mesmas práticas antigas e outros apostando na inovação. Neste cenário, onde ficam os sites? Bem, os sites ainda precisam entender como ganhar dinheiro. E nessas idas e vindas do jornalismo uma aposta pode ajudar a dimensionar as dificuldades jornalísticas e, possivelmente, aponta para uma direção criativa: o newsgame.

Como dizem Ian Bogost, Simon Ferrari e Bobby Schweizer, pesquisadores vinculados ao MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, uma das universidades mais proeminentes do segmento), em seu livro Journalism at play, “jogos simulam como as coisas funcionam construindo modelos com os quais as pessoas podem interagir”.  Essa capacidade de entendimento por meio de interação foi nomeada por eles de procedural rethoric (ou retórica procedimental, em tradução livre).
Resumidamente, os pesquisadores norte-americanos apontam que a união entre jornalismo e games, chamada de newsgames, funciona porque “certas qualidades dos videogames os tornam a mídia complementar ideal para uma educação jornalística”. Ou seja, muda a forma tradicional como se enxerga o jornalismo e atinge a tão necessária reinvenção da produção jornalística.

Segundo Heloisa Helena Oliveira Buarque de Hollanda, pesquisadora filiada à Faculdade de Letras e ao Programa Avançado de Cultura Contemporânea da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em artigo publicado em novembro, os newsgames são “um modelo de jogo digital que se vale de acontecimentos reais para produzir e difundir conceitos sócio-políticos na rede”. Esse termo, que de acordo com ela “foi criado em 2003, pelo uruguaio Gonzalo Frasca, designer, fundador da empresa Powerful Robot e autor do jogo ‘September 12th’”, demonstra que os videogames podem fazer bom jornalismo. E de forma relativamente simples: dando jogabilidade a uma notícia.

O Brasil é o mercado ideal para esse tipo de criação jornalística. Afinal, o País é o maior mercado da América Latina, é o 11º no ranking global de movimentação relacionada a games em dinheiro, com perspectiva de mover US$ 1,33 bilhão apenas em 2014, especialmente em função dos 49 milhões de jogadores encontrados por aqui. Logo, é preciso investir nessa ideia no Brasil, como vem fazendo a Superinteressante, revista do Núcleo Jovem da Editora Abril.

A produção da revista, atualmente liderada por Fred di Giacomo, é referência mundial na produção de newsgames. Como ele mesmo conta ao blog Jornalismo nas Américas, mantido por Natália Mazotte, aluna da Universidade de Austin, no Texas, sua participação no desenvolvimento de newsgames aconteceu logo em um dos primeiros jogos lançados pela Abril, o Strip Quiz. Outros destaques da produção da revista no mundo dos newsgames são a Corrida Eleitoral, que tinha como gancho as eleições presidenciais de 2010, o Filosofighters, cujo insumo era apresentar as ideias dos principais filósofos, e até um game exclusivo para Facebook, o Quis City.

Desde então, outras empresas – como G1 e Estadão – também passaram a apostar no formato e, em quase todas as ocasiões, de forma bem-sucedida. Mesmo assim, no entanto, o modelo ainda não é muito difundido na mídia nacional e as tentativas de acerto ainda envolvem muitas incertezas. De forma mais negativa, vale citar a dificuldade das mídias alternativas de engrenarem nesse nicho.

Di Giacomo aponta que a pouca disseminação dessa ideia no Brasil não está necessariamente associada a um viés tradicional de apresentar a notícia. “A dificuldade para trabalhar com newsgames nas mídias alternativas é o custo”, porque “esse tipo de trabalho exige uma equipe multimídia que nem todo veículo menor tem disponível”. No entanto, para ele, os jogos podem ser uma ferramenta poderosa. “O formato tem grande potencial não só para atrair mais público, com seu enorme poder de simulação e envolvimento da audiência, mas também para diversificar o conteúdo e agregar valor a essas marcas”.

Agregar valor às marcas. Nesse ponto, di Giacomo resume de forma muito simples um dos maiores desafios dos meios de comunicação online brasileiros. Com uma dominância dos grandes impérios e a pouca democratização da produção jornalística, o jornalismo independente ainda corre o risco de sucumbir frente à mídia tradicional. A partir do momento em que essa possibilidade se diluir – se é que esse cenário se tornará viável algum dia –, os newsgames podem fomentar o crescimento da mídia tida como alternativa.

Nesse dia, finalmente, será possível desbancar a imprensa tradicional, que ainda é poderosa por aqui. Mudando o contexto completamente - tirando a afirmação de di Giacomo da zona dos newsgames e levando-a para um âmbito jornalístico geral -, ainda temos muito o que testar. “Ainda estamos só no começo”.



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